Já lhe disseram que o meio-termo é um dedilhar o amansamento. E mesmo ele não sendo um às na arte de equilibrar isso e aquilo, acredita que é dos menos descompensados, até porque, neste exato momento, ele se equilibra nas pontas dos pés, só para assistir, lá naquele adiante, à cena recorrente: ela caminha pela plataforma, entre tantas pessoas, uma estranha que invadiu seu olhar faz alguns meses. E desde o dia em que, sem querer, sentaram-se no mesmo banco do trem, e ela tirou de sua bolsa um exemplar do livro preferido dele, o moço sente uma vontade imensa de dizer a ela o mesmo que o personagem do livro diz a quem sequestrou o apreço dele: se não puder me amar, permita-me ao menos amá-la explicitamente. Só que ele é meio zonzo com essa coisa de amor, de explícito seus sentimentos têm nada. Ele segue assim, carregando a moça no olhar, preenchendo a distância com o desejo de que, dia desses, ela olhe para ele de volta e sorria, convidando o amor dele para se achegar à companhia dela.
| Carla Dias |
© Juja Kehl |
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