Tira do bolso um bilhete e o lê, atentamente, seu semblante sendo modificado, como se nele se esculpisse o sentimento. Quantos anos? Vinte… E ainda se lembra das gentilezas que ela cometia em nome do apreço que sentia por ele. Ninguém nunca o tratara de forma mais terna. Pena ele ter levado tanto tempo para compreender isso. Então, recusou tais gentilezas, educadamente, sem perceber que, ao renegá-las, não havia polidez que sublimasse a tristeza que ela sentia. De todos os agrados que ela lhe fez, o bilhete foi o mais marcante, o qual a entrega ela deixou por conta do destino, e que ele encontrou ao folhear um dos livros que ela lhe dera de presente. Ele se encantou por ela anos depois de ela ter se mudado de cidade, de ter desistido de se fazer perceber por ele. Esse bilhete de destinatário desatencioso às nuances da ternura sincera, poucas palavras e muitos significados, o faz sentir saudade de tudo o que poderia ter vivido e não viveu. De quem poderia ter sido e jamais será.
| Carla Dias |
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