HIPERBREVES

DESAMOR

Recebeu o golpe em silencio, sem um gemido. Ele dizia que a amava e ela acreditava, pois jamais tinha recebido nenhum outro tipo de amor. O chão a recebeu cálido e sua textura pareceu-lhe aconchegante, só então se permitiu um gemido suave, quase sensual, e apenas perceptível. Abandonou-se naquela caricia de barro. Sabia que amanheceria com o corpo tingido com a cor da penitencia, aquela mesma cor que usavam os padres para vestir o corpo dos santos, quando chegava a Páscoa. A cor da espiritualidade e da expiação lhe dissera o padre Damião, naquele dia que não sabia a quem recorrer e, maldita a hora, se encontrou com ele. Ainda no seu leito de barro, naquele segundo em que o amanhecer se desprende do abraço da noite, ela pensou por última vez, com desconsolo, na enormidade de seu único pecado… até que a morte os separe.

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Yolanda S. Meana
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Yolanda S. Meana

Yolanda S. Meana

Jornalista e escritora.
Vive na Granja Viana.