Aos 40 já não me impressiono facilmente. Não me impressiona a euforia, tampouco a tristeza genuína. Aos 40 me impressiona a anestesia.
Sequer me impressiona a generosidade ou o narcisismo. Mas me choca a apatia.
Me impressiona a sedação.
O dopping generalizado.
Nos dopamos enquanto vagamos nos corredores largos do shopping, embora nossa mente siga por espaços estreitos. Restritos demais para a nossa alma grandiosa.
Nos dopamos nas redes sociais, moribundos que arrastam os dedos pra cima, vendo telas pequenas, enquanto a vida segue pra lá de onde os olhos alcançam… Nos anestesiamos, sobretudo, com remédios, de forma mais franca e óbvia, quando engolimos em dois goles a alegria e a coragem de seguir adiante.
Me impressiona a vida sem rédeas, e a sensação gélida e dolorosa, como um beliscão fino, de que o tempo nunca nos consumiu tanto, enquanto nós consumimos como nunca.
Aos 40 me pergunto, todos os dias, se essas são as minhas escolhas. Se o modo como acordo e como me deito, fui eu que escolhi ou se estou também sedada. Aos 40 temo não me dar conta da grandeza de coisas pequeninas, temo não estar lúcida e forte para traçar o meu próprio caminho, de possibilidades vastas e infinitas, ainda que cheio de restrições práticas…
Me impressiono com nossa capacidade de nos apequenarmos em vidas mesquinhas – as vezes miseráveis – tendo asas no lombo e natureza tão, absolutamente tão, genial.
Aos 40 não me choco com estádios lotados e shows muito elaborados.
Mas ainda me impressiono com o espetáculo cotidiano, que segue, pra além de onde alcançam os olhos.
Aos 40, desejo não perdê-lo de vista.
- O FIM DA LISTA - 31/12/2018
- AOS 40 - 11/06/2018