A partir da semana 10 de isolamento social, o cansaço passou a imperar.
Houve um tempo em que escrever era uma forma de liberar a mente, mas por onde começar quando as ideias também ficam caóticas e o pensamento não consegue se organizar?
Nesses dias, em que as notícias são um acumulado de agouros, em que não se tem um dia sequer de descanso desse governo absurdo, em que se vê “humanos” sem empatia e respeito pela morte e luto alheios, um certo tipo de desolação vai se alastrando.
Levantar da cama já não é tão simples – e quem sabe se eu não tivesse tanto trabalho, duas cãs, marido e casa pra cuidar, talvez passasse os dias trancada num quarto escuro – não por depressão, que não padeço desse mal, mas por esgotamento: tem muita dor escorrendo pelo mundo.
E quando elas se somam às nossas próprias dores?
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Foi na quinta semana de quarentena que conheci uma questão familiar que me pôs de joelhos: fui tomada por um pesar tão intenso quanto o que senti quando da morte do meu pai. Ainda bem que era sábado e pude dormir o resto do dia – o sono me recupera.
Não vou entrar no mérito porque a ocorrência não me pertence e outras pessoas que amo estão sofrendo ainda mais, pois a elas ainda pesa a responsabilidade por decisões difíceis e extremas.
Como ateia, pra mim vale a Ciência, sem peso nenhum de consciência, pois não sou escrava de dogmas – minha religião é a praticidade. Mas respeito a fé alheia e até reconheço (sem muita convicção) que a vida pode ser mais fácil para quem acredita num ser que protege, ajuda, olha.
Mas o que dizer quando, para esses, essa divindade parece se abstrair, ignorar, sumir? Esse “deus chamado Deus” às vezes ensurdece? Trunca a comunicação? Não é da minha conta, mas se eu acreditasse em algo assim ficaria furiosa com o silêncio, a ingratidão, o descaso.
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Minha sensação é de que estamos todos no piloto automático, desinteressados de lives – shows, debates, dicas -, maratonas de séries, filmes, documentários. Eu estou. E ainda falta concentração pra ler.
As redes sociais distraem, mas também enfadam – quando não nos desanimam mais com tanta informação pesada, tanta “gente de bem” que ataca, espalha fakenews e deixa um rastro de ódio.
Os encontros virtuais promovem uma certa angústia: todo mundo longe, os delay’s que fazem todos falarem quase ao mesmo tempo – o zoom é uma zona. Não fosse por poder ver as pessoas e eu diria que dá mais tédio e aumenta a sensação de distanciamento.
Espero um dia, considerando que vou continuar viva, olhar para esses tempos, registrados aqui, e pensar: “Sobrevivi a isso também…”
E, finalmente, poder abraçar àqueles que amo e gosto…
Imagem: Craig Adderley, Pexels
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