Saiu do vagão desaforada, as portas fechando-se em suas costas. Galgou as escadas aos atropelos, cuspida às ruas pelo dragão. O sopor tomava-lhe conta da mente. Recompôs o rosto, alongou o corpo dolorido e caminhou pela calçada deserta. A sombra de um respingo atravessou-lhe a nuca. Alguma coisa a incomodava. Talvez a noite vazia de estrelas, o sorriso rasgado da lua a burlar-se dos humanos. Acelerou o passo, quase a correr. Abriu a porta e foi direto ao quarto. Vestiu a camisola de cetim azul, lavou os dentes, hidratou a pele, pôs duas gotas de essência de jasmim no decote, penteou o cabelo. Foi até a janela e abriu a cortina. No mesmo instante, no prédio em frente, uma mulher com um pente na mão esticou o braço e, num gesto idêntico, afastou as cortinas. Olharam-se assombradas. A mesma camisola azul, o rosto repetido. Agitaram as mãos e os pentes caíram. Ambas gritaram antes de desvanecer. Num comunicado, a Prefeitura informou, no dia seguinte, que estava espelhando as fachadas.
| Yolanda Serrano Meana |