Já foi libertário. Panfletou sobre assuntos polêmicos. Berrou sua crença e a perseverança. Discutiu a felicidade com a mesma paixão que devotava aos ideais. Acreditava que a felicidade era prisão disfarçada de oferenda da boa sorte. Em nome dela, muitos agonizavam em mil parcelas disso e daquilo, em relacionamentos que nasciam condenados à frigidez emocional, onde se desempenhava o papel do satisfeito que a felicidade exigia. A felicidade do melhor, do mais pomposo. Odiou a felicidade por muito tempo, até conhecê-la na intimidade do beijo e na maciez da pele da moça, sobre quem panfletou apaixonadamente, amparado por sorrisos que lhes escapavam rebeldemente, intimidando seu discernimento. Decidiu dividir a vida com ela, e lhe comprou – em intermináveis parcelas – casa, carro, móveis, roupas, comida. Banca o satisfeito, mesmo quando a moça o ignora, porque teme – prisioneiro que é de tal presença – que ela o deixe a sós com a felicidade intranquila. Até que só lhe reste engolir o vazio.
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