Aquilo não ficaria assim. Num futuro próximo o pai teria de escancarar seu ódio na frente da menina, com toda a contundência que o levara a matar, para que ela pudesse aceitá-lo contra a hipocrisia do mundo. Ele entraria em grotescos detalhes, revivendo sua ira diante da filha, e contaria por que precisou de uma faca para arrancar punhaladas de vida do corpo da mãe. E de como um revolver não teria bastado, já que ele precisava de algo que destruísse mais, numa extensão de seu corpo, numa extensão de seu braço. E que nos meses que se seguiram ao crime, centenas de vezes ele havia matado Consuelo, novamente e novamente, golpeando a noite vazia com o braço, feito um demente que abraça fantasmas.
| Maitê Proença | “Uma vida inventada”
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