Queria escrever uma carta explicando porque tinha partido assim, sem deixar vestígio, aviso ou bilhete – só o lenço florido com o perfume preferido sobre o travesseiro. Queria dizer que não era nada com ele – apenas não podia mais permanecer. Olhava para o papel reciclado, daquela cor que sempre lhe pareceu um entardecer triste, buscando as palavras certas: será que existe um jeito de dizer adeus depois de sumir? Será que tem como justificar as urgências libertárias sem causar mágoa? Ela, que não acredita em nada, tenta uma prece que rogue aos deuses de todas as lendas um jeito de ser perdoada pelas escolhas que causam dores alheias. Vai até a varanda do quarto de hotel e olha a nova cidade do alto, suas luzes intensas na madrugada silenciosa. E desiste: melhor ser memória de fúria do que de tristeza. Um dia, quem sabe, poderá olhá-lo nos olhos uma vez mais e dizer que isso também foi por amor. Por si mesma.
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