A diretora Margaret Betts faz sua estreia no cinema usando o ambiente religioso como base – um dos mais sufocantes quando se trata de liberdade de expressão e sexualidade -, e uma adolescente em processo de tornar-se mulher.
A atriz Margaret Qualley, que também pode ser considerada novata no mundo cinematográfico, entrega uma boa atuação num drama que surpreende pela linguagem realista, impactante e seca.
Em evidência, estão as resoluções do Vaticano na década de 60 no que foi chamado de Concílio Vaticano II – um Concílio Ecumênico da Igreja Católica, convocado no dia 25 de Dezembro de 1961, através da bula papal “Humanae salutis”, pelo Papa João XXIII. Este mesmo Papa inaugurou-o, a ritmo extraordinário, no dia 11 de outubro de 1962. O Concílio, realizado em 4 sessões, só terminou no dia 8 de dezembro de 1965, já sob o papado de Paulo VI, com decisões expressas que regulamentavam a Igreja Católica e que deveriam ser postas em prática imediatamente, com a intenção de atualizar a Igreja.
Nesse cenário, está uma pequena família composta de pais separados – e sem qualquer religiosidade -, e a menina Cathleen (personagem de Margaret Qualley) -, que aos 17 anos decide tornar-se freira.
Julianne Nicholson, na pele da mãe, tem participação coadjuvante, mas seu personagem consegue traduzir com exatidão a indignação e a impotência diante desse inesperado determinismo da filha.
A extraordinária Melissa Leo é a Madre Superiora do Convento onde Cathleen decide iniciar seu Noviciado. Sob regras rígidas e penitências que o Vaticano está abolindo, ela conduz o treinamento com mão de ferro, recusando-se a aceitar e implementar as mudanças impostas.
Nesse caldo de repressão, clausura, imposição de silêncio e distanciamento do cotidiano comum, proibidas de qualquer contato físico – inclusive com seus familiares -, é inevitável que dúvidas e questionamentos imperem – quase como uma presença corpórea pelos cantos do monastério. Um tipo de arrebatamento que beira a loucura também se torna passível – assim como clarões de lucidez que podem levar à ruptura.
Como ateia, o filme me causa enorme espanto de que as pessoas possam sucumbir a ideias tão retrógradas, mutilar-se, anular-se e padecer em nome de uma causa tão fluída como é, para mim, a religião.
Por outro lado, consigo alcançar alguma empatia para compreender a resistência de mulheres que trilham esse caminho, perseguindo algo que só pela crença é possível, em abandonar suas convicções – sob pena de um enorme vazio para o qual poucas estariam preparadas. Além disso, para onde iriam depois de tanto tempo presas entre paredes de pedra, sem qualquer tato ou vínculo humano e nenhuma experiência de vida?
O filme tem uma certa lentidão – quase necessária -, e talvez pudesse ter se aprofundado mais em algumas questões; ainda assim, vale muito como reflexão num mundo que muda a todo instante, mas que tem em muitas sociedades o pilar da religiosidade como um esteio, que certifica e atesta que a Igreja é uma instituição que deve ser seguida.
Veja o trailer e assista para tirar suas próprias conclusões… ?
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