CRÔNICAS ESTILO 40 ESTILO DE VIDA

NAOMI OSAKA E O RACISMO

E o protesto contra o racismo finalmente chegou ao mundo esportivo – espanta um pouco que não pelas mãos (ou pés) do Futebol, que tem uma das demonstrações do preconceito mais contundentes das torcidas, que vão dos absurdos de chamar jogadores de ‘macaco’ a jogar bananas no campo.

Quem me conhece, sabe que sou amante do esporte – mais especialmente do Tênis.

E quando o time de basquete Milwaukee Bucks e, na sequencia, os outros times da NBA resolveram não entrar em quadra na noite de ontem em protesto por Jacob Blake – o homem negro baleado sete vezes pelas costas por um policial branco nos EUA -, a tenista Naomi Osaka decidiu se posicionar e levantar a bandeira do movimento contra o racismo no Tênis.

Naomi é ex-número 1 do mundo, japonesa negra – mãe japonesa, pai haitiano -, e anunciou ontem à organização do torneio de Cincinnati – e pelas redes sociais -, que não jogaria sua semifinal – contra a belga Elise Mertens.

O Tênis, todo mundo sabe, é um esporte de elite. Nesse contexto de fãs teoricamente bem educados, não há grandes manifestações racistas aparentes. Em suas arquibancadas não ocorre o chamado ‘efeito manada’ – característico de grandes grupos. Diferentemente do Futebol, por exemplo, torcedores de jogadores distintos sentam-se lado a lado sem nenhuma animosidade. Conversam, discutem o jogo, torcem para lados opostos sem qualquer problema.

Mas como em todos os lugares do mundo, jogadores negros também são minoria na modalidade – assim como juízes (não tenho certeza, mas acho que o brasileiro Carlos Bernardes é o único juiz negro de Tênis (para torneios maiores, como Grand Slam’s – e ele só chegou a mediar essas partidas a partir de 2011).

Tenho enorme admiração por Naomi Osaka. Quando venceu seu primeiro Grand Slam, em 2018, numa disputa memorável contra a americana, também negra, Serena Williams, consagrando-se a primeira japonesa a levar o título de simples feminino de um GS, encantou o público pela postura (Serena se esforçou pra ofuscá-la), pela humildade e pela doçura.

E agora honra seus fãs pela força destemida – não é fácil abrir mão de uma semi-final num torneio grande como Cincinnati (que, por causa da pandemia, nesse ano está acontecendo em Flushing Meadows, em NY, antecedendo o GS US Open).

Ao aderir ao boicote de atletas da NBA, WNBA, MLS e MLB, ela amplia o debate – hoje, todos que tentaram assistir sua partida, seja pela TV ou streaming, descobriram que foi cancelada, mas, mais importante, POR QUE foi cancelada.

Osaka escreveu: “Olá, como muitos de vocês sabem, eu estava com meu jogo das semifinais agendado para amanhã. No entanto, antes de atleta, eu sou uma mulher negra. E, como uma mulher negra, eu sinto que têm muitos assuntos mais importantes acontecendo que precisam de atenção imediata, mais do que me ver jogar tênis. Eu não espero que nada drástico aconteça por eu não jogar, mas se eu conseguir iniciar uma conversa em um esporte majoritariamente branco, eu considero um passo na direção certa. Assistir o contínuo genocídio de pessoas negras nas mãos de policiais me deixa enojada. Estou exausta de ver novas hashtags surgindo e extremamente cansada dessa mesma conversa de novo e outra vez. Quando isso terá um basta?”

No mundo globalizado e cada vez mais digital, levantar hashtags é importante também e sabemos que, nos últimos anos, muito tem sido feito; mas, infelizmente, como se tem visto, ainda não é suficiente.

 

 

Débora Böttcher
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Débora Böttcher

Débora Böttcher

Formada em Letras, com especialização em Literatura Infantil e Produção de Textos. Participou do livro de coletâneas "Acaba Não, Mundo", do site "Crônica do Dia", onde escreveu por 10 anos. Publicou artigos em vários jornais. Trabalha com arte visual/mídias. Administra esse portal - que é uma junção dos sites Babel Cultural, Dieta com Sabor, Hiperbreves, Papo de Letras e Falas Contadas.