Ídolo da minha geração e ícone das seguintes, David Bowie sempre será lembrado por sua irreverência, versatilidade e estilo excêntrico.
De espírito camaleônico, era um mestre da reinvenção na arte da interpretação e, sempre imprevisível e incapaz de se abater com os deslizes – parte inevitável das trajetórias de sucesso -, ressurgia a cada nova criação.
Não é possível, portanto, resumir em poucas linhas um trabalho de décadas que inspirava, divertia, emocionava e o elevava a estrela de primeira grandeza – mesmo para quem não era seu fã.
E, afinal, no dia de sua morte tem muita gente de peso escrevendo sobre ele. Assim, só me resta um breve registro de sua trajetória e esse sentimento de tristeza definido com precisão pelo escritor português Valter Hugo Mãe:
“[…] a noite já sabe que o dia, hoje, não terá como clarear.”
Nascido David Robert Jones em 08 de janeiro de 1947, em Brixton, bairro do sul de Londres, era filho de uma garçonete e do administrador de uma instituição de caridade – o que lhe garantiu uma infância normal. Formou a primeira banda aos 15 anos, The Konrads, e mudou o sobrenome para Bowie em 1966, quando já vislumbrava a vida artística, para evitar ser confundido com o vocalista dos Monkees, Davy Jones.
Bowie casou-se duas vezes: viveu 10 anos com Angela Barnett, com quem teve um filho, Zowie – que mudou de nome e hoje é conhecido como o diretor de cinema Duncan Jones -, e em 1992, casou-se com a modelo somali Iman, com quem teve uma filha, Alexandria.
Segundo a BBC, Bowie estudou budismo e mímica antes de lançar seu primeiro álbum – The World of David Bowie, em 1967. Mas só veio a a chamar a atenção do público em 69 com a faixa-título de seu segundo álbum, Space Oddity: a aventura espacial de Major Tom, um astronauta abandonado em órbita da Terra, foi um dos maiores hits do ano em que o homem chegou à Lua pela primeira vez.
Em 1971, um ano após a separação dos Beatles, Bowie tomou as rédeas criativas do rock and roll com Hunky Dory, álbum que muitos críticos já consideraram o melhor de sua carreira.
Nessa mesma década, produziu dois clássicos do rock – os álbuns Transformer, de Lou Reed, e Raw Power de Iggy & The Stooges -, e escreveu o hit Fame com John Lennon. Isolado em Berlim, produziu ainda uma trilogia de álbuns experimentais (Low, Heroes e Lodger), marcada por letras de vanguarda e, sempre à frente do tempo, flertes com a música eletrônica.
David também começou a galgar seu espaço no cinema e no teatro, e suas primeiras experiências como ator profissional deram-se a partir de 1976: ele estrelou o filme O Homem que Caiu na Terra e trabalhou ao lado da diva Marlene Dietrich em Gigolô. Suas aventuras cinematográficas continuaram ao longo de sua vida, de longa-metragens como Furyo: Em Nome da Honra (1983), ou em pontas – como fazer a voz de um dos personagens da série de desenhos animados Bob Esponja. Um dos meus filmes preferidos é Labirinto – A Magia do Tempo, de 1986.
Ele também brilhou no teatro, interpretando o papel-título de O Homem-Elefante, na Broadway.
Pioneiro, no início dos anos 90 foi ele um dos primeiros artistas do mundo a lançar um website – e a jogar ações na Bolsa de Nova York, faturando US$ 55 milhões.
A década seguinte começou com o lançamento de Heathen (2002), álbum que voltou a entusiasmar público e crítica.
Mas, em 2004, o britânico sofreu um ataque cardíaco em pleno palco durante um show na Alemanha e, a partir daí, com raras exceções, Bowie desapareceu da vida pública – uma dessas raras aparições foi em 2006, quando Bowie gravou uma participação na série cômica de TV “Extras”.
Então surpreendeu novamente em 2013, quando quase dez anos após sua reclusão, lançou The Next Day: o álbum se tornou seu primeiro número 1 no Reino Unido em mais de 20 anos – uma posição que sua última obra, Blackstar, lançado na última sexta-feira, quando completou 69 anos, parece fadada a alcançar.
A retrospectiva de seus trabalhos rodou museus no mundo todo, inclusive no Brasil, no Museu da Imagem e do Som de São Paulo (2014), com um acervo pessoal que reunia fotografias, figurinos, pinturas e cenários usados ao longo de seus 46 anos de carreira.
Nos últimos dois anos, teve pouca aparição pública e sua morte, vítima de câncer (no fígado), cai como mais uma surpresa. Mas se resta algum consolo, é saber que Bowie realizou tudo o que previu e se despediu da vida como um Gigante – suas derradeiras imagens, feitas no dia de seu aniversário, 08/01, mostram um Bowie, como sempre, estiloso e elegante.
A última peça que escreveu, Lazarus – uma extensão de um de seus melhores personagens no cinema, “O homem que caiu na terra” – , está atualmente em cartaz na Broadway (estreou em 07/12/2015).
Blackstar – um nome agora impossível de dissociar-se de sua morte – é seu último legado – excêntrico, irreverente e imprevisível como foi toda sua vida, e que então lhe confere o direito de se reinventar eternamente…
Assista também ao clip Lazarus, um vídeo que foi muito comentado na sexta-feira, 08, dia do aniversário e lançamento de Blackstar, por mostrar Bowie numa cama de hospital.
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