Ao anoitecer, o marido passa para buscá-la. E no caminho de casa vão os dois calados, respirando o veneno do ar, quando ela torna a vê-lo no turbilhão das ruas: esse corpo, essa cara que sem palavras pergunta e chama. E desde então, ela o vê com os olhos abertos, em tudo que olha, e o vê com os olhos fechados em tudo que pensa, e o toca com seus olhos. Este homem vem de algum lugar que não é este lugar e de algum tempo que não é este tempo. Ela, mãe de, mulher de, é a única que o vê, a única que pode vê-lo. Já não tem mais fome de ninguém, fome de nada, mas cada vez que ele aparece e se desvanece, ela sente uma irremediável necessidade de rir e chorar os risos e os prantos que engoliu ao longo de tantos longos anos, risos perigosos, prantos proibidos, segredos escondidos em quem sabe que cantos de seus cantos. E quando chega a noite, enquanto o marido dorme, ela vira de costas e sonha que desperta.
| Eduardo Galeano | “As palavras andantes”
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