Ele perde. Eu localizo. Ele espalha. Eu recolho. Ele guarda. Eu descarto. Sou sua vice-versa.
Ele é indoor; eu, outdoor. Eu reclamo; ele salva. Eu publico; ele reserva. Ele planta árvore; eu, livro. Tudo é semente.
Ele prefere pão queimadinho. Eu, branquinho. Ele gosta do chuveiro mais frio, no 3, quase 2. Eu no 4, pelando; às vezes, 5. Ele corre a São Silvestre. Eu evoco o São Benedito. Minha música é alta. A dele, branda. Ele gosta do silêncio; eu careço do ruído. Nosso conflito é o decibel.
Eu abasteço a geladeira com água de coco, só para ele. Ele compra Amandita, só para mim. Ele briga porque como o pacote inteiro de suspiro. Eu sempre digo que não fui eu.
Ele deixa a TV ligada. Eu tenho preguiça de reciclar. Ele não apaga as luzes. Eu uso papel higiênico demais. Cada um com seu crime ambiental.
Eu reponho o sabonete dele, quando acaba. Ele me traz água no quarto, do jeitinho que gosto: 2/3 gelada e 1/3 natural. Eu coloco seu celular para carregar. Ele faz as contas para mim.
Ele pendura a roupa no varal. Vou lá, acertar os pregadores. Ele arruma a mesa para o jantar. Finalizo, colocando o que ele esqueceu. Ele guarda as coisas na geladeira. Surjo em seguida, realocando tudo. Ele lava a louça. Eu passo o rodinho na pia e reorganizo o escorredor. Eu finjo que não fiz nada. Ele finge que não me viu fazer.
Ele lê o que escrevo, bronqueia que não é indoor coisa nenhuma. Eu concordo com ele e me retrato: ele não é indoor coisa nenhuma.
Eu emprestei meus sobrinhos para ele. Ele emprestou os dele para mim. Nunca mais devolvemos.
Ele tem três filhos, dois comigo. Eu tenho dois, três com o dele. Dá tudo no mesmo.
A mãe dele colecionava “Mãos de Ouro”. A minha também. As duas, que não se conheceram, estão lá, tricotando pros anjos, cuidando de nós e inventando novos pontos para essa bendita trama de yin e yang.
Casamento é sorte, resiliência e bom humor. Na vida a dois, os opostos não se atraem; eles fazem sinal para o mesmo táxi. E dividem a viagem.
O resto é marmelada afetiva.
…
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