LITERATURA INFANTIL

LITERATURA DE INCLUSÃO

 

Martins_Fontes-Paulista

 

Fazia tempo que não andava pela região da Paulista (SP) e ontem estive na Livraria Martins Fontes (vendas web), um oásis para amantes da Literatura e Cultura. O espaço, amplo e muito bem distribuído, é um refúgio para os aficionados por livros.

Nessa minha empreitada de êxtase, dei de cara com alguns livros da literatura infantil e infanto-juvenil que me chamaram especialmente a atenção.


O primeiro, foi o exemplar Frida Kahlo da Coleção infantil “Antiprincesas“. Lançada em meados de setembro de 2015 pela editora argentina Chirimbote, a coleção de autoria de Nadia Fink, tem como proposta apresentar histórias sobre a vida de mulheres latino-americanas que foram protagonistas em suas áreas.

A ideia é desmistificar as histórias de princesas inventadas – que fazem com que, muitas vezes, meninas pensem que são uma delas e idealizem uma realidade paralela inexistente -, trazendo histórias de vida de mulheres reais, inspiradoras e pioneiras.

A Coleção “Antiprincesas“ já conta com quatro livros publicados – esse primeiro da artista Frida Kahlo,  a famosa pintora mexicana, enquanto o segundo foi dedicado à Violeta Parra, a mais importante folclorista do Chile, fundadora da música popular chilena. O terceiro livro é sobre Juana Azurduy, heroína militar nascida na Bolívia, que participou das lutas pela independência da América espanhola. A escritora brasileira Clarice Lispector é a quarta antiprincesa da série – que também lançou a coleção “Antiheróis”, que já conta com as histórias dos escritores Julio Cortázar (argentino) e Eduardo Galeano (uruguaio)e promete outras biografias dentro do mesmo contexto.

Inspirar meninas e meninos mostrando que podem ser muito mais do que príncipes e princesas é um dos motes da coleção, que busca mostrar um modelo de mulher bem diferente do que é estereotipado pela Disney e de homem muito além dos super-heróis.


Os outros quatro livros que me encantaram são da editora Boitempo e compõe a Coleção Livros para o Amanhã, do selo Boitatá, pensada para adolescentes, que discute a maneira como as pessoas se relacionam em sociedade.

“A democracia pode ser assim”, “A ditadura é assim”, “O que são classes sociais” e “As mulheres e os homens” são os títulos que compõem a coleção.

Boitata


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Ilustração de Marta Pina

Em “A democracia pode ser assim”, com ilustrações de Marta Pina, o conceito de democracia é apresentado a partir de imagens próximas do cotidiano das crianças, tomando como exemplos a hora do recreio e o jogo: atividades em que todos que participam têm de tomar decisões e assimilar suas regras. O texto se propõe a ser uma primeira abordagem à cidadania e a questões sociais, elucidando o que são as eleições, o papel dos partidos políticos e a importância do voto, dos direitos humanos e da informação para a manutenção das liberdades, tornando mais convidativos temas que de início podem intimidar crianças e adultos.

Ao final, foram incluídos dois textos informativos e um roteiro com questões para reflexão, ajudando o leitor a assimilar os tópicos abordados. Outro diferencial foi a inclusão de fotos 3×4 enviadas pelos leitores da editora Boitempo nas capas internas deste livro, acréscimo exclusivo para a edição brasileira.


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Ilustração de Mikel Casal

“A ditadura é assim” traz as ilustrações do artista contemporâneo Mikel Casal para  mostrar o funcionamento e os perigos da ditadura partindo de exemplos simples, a fim de que as crianças compreendam os problemas existentes em um sistema político que privilegia uma única corrente de pensamento em detrimento das outras. Partindo de questões como “Pode haver liberdade ou justiça em uma ditadura? Para quem?”, o texto guia o leitor mirim à conclusão de que falta cidadania a um Estado que não respeita a diversidade do povo que representa.

Nesse livro, que contém caricaturas dos ditadores de todo o mundo, foram acrescentadas duas ilustrações dos ditadores brasileiros Emílio Médici e Ernesto Geisel, feitas especialmente também para a edição brasileira.


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Ilustração de Joan Negrescolor

O que são classes sociais? parte da da premissa de que todas as pessoas são iguais, mas que existem coisas que as tornam diferentes. Nesse contexto, com ilustrações de Joan Negrescolor, o livro expõe de um jeito simples a complexidade das dinâmicas sociais e do mundo do trabalho.

“Por que uns têm mais do que outros? Por que uns mandam mais do que outros? Por que uns vão para a universidade e outros param de estudar para trabalhar?” Através de perguntas simples, a ideia é promover uma reflexão lúdica sobre a disparidade social, além de estimular o interesse dos pequenos leitores para que possam refletir e tirar suas próprias conclusões sobre os tópicos abordados.

O livro passou por uma interessante reformulação do ponto de vista gráfico: se na década de 1970, quando foi originalmente publicado, a representação da classe alta e dos trabalhadores era inconfundível – com homens de terno e operários em uniformes –, hoje a diferenciação se dá mais pelo poder de compra (carros, tecnologia, iates, ilhas particulares), o que evidencia as transformações pelas quais o mundo passou nos últimos anos.

O que são as classes sociais? traz uma importante lição: a de que todas as pessoas têm os mesmos direitos e que, enquanto houver desigualdade, deverá haver a busca por uma sociedade mais justa. Além disso, um jogo de tabuleiro chamado “cobras e escadas” ilustra as páginas de guarda do livro, complementando de forma divertida a reflexão sobre o tema.


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Ilustrações de Luci Gutiérrez

“As mulheres e os homens”  procura abordar questões de gênero por um viés de igualdade e respeito à pluralidade.

As conquistas no campo político e social levaram as mulheres a ganhar espaço em várias esferas da vida pública, mas ainda falta muito para alcançarmos a igualdade de gênero. As mulheres continuam sofrendo muita discriminação no mundo todo e ainda são poucas ocupando cargos de grande responsabilidade e liderança, mesmo estando tão preparadas quanto os homens.

Nesse contexto, como as crianças estão sendo educadas e o que significa, para elas, ser homem ou mulher? O desafio da ilustradora espanhola Luci Gutiérrez foi criar uma série de desenhos que atualizasse o debate sobre gênero e o tornasse acessível ao universo infantil. Através da imagem, o livro expressa muitos elementos sutis que não estão no texto – tarefa que Luci executa com maestria. Na cena em que é dito que desde pequenos os meninos e as meninas são tratados de formas distintas, ela mostra um garoto tendo a mão apertada com força, enquanto a menina é tratada com delicadeza. Isso porque é comum se ensinar aos homens que eles devem ser viris e às meninas, que elas são o sexo frágil.

Instigante e de fácil compreensão, com uma paleta de cores que foge do já consagrado azul-para-meninos e rosa-para-meninas, o livro também traz atividades para promover uma discussão mais ampla sobre a divisão das tarefas domésticas, a desigualdade salarial e o espaço social que cada gênero ocupa – deixando a certeza de que a expectativa por um mundo mais igualitário não tem nada de ultrapassada.


É preciso alertar, entretanto, que esses são livros para pais que pretendem educar filhos com maior consciência de vida e sociedade, fazendo-os pensar fora da caixa, pois ampliam a visão de realidade e de mundo, rumo à construção de um futuro melhor para todos – que os pequenos de hoje edificarão amanhã.

 

Débora Böttcher
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Débora Böttcher

Débora Böttcher

Formada em Letras, com especialização em Literatura Infantil e Produção de Textos. Participou do livro de coletâneas "Acaba Não, Mundo", do site "Crônica do Dia", onde escreveu por 10 anos. Publicou artigos em vários jornais. Trabalha com arte visual/mídias. Administra esse portal - que é uma junção dos sites Babel Cultural, Dieta com Sabor, Hiperbreves, Papo de Letras e Falas Contadas.