Estou longe de ser uma pessoa que foge de si mesma. Para mim, um dos três grandes prazeres da vida (sobre os outros dois comentaremos em outra ocasião) é estar sozinha e em silêncio, me conectando com as coisas que sinto e tentando encontrar alguma lógica para meus pensamentos (geralmente não encontro). Desde muito cedo me interessei por ciências que me proporcionassem aquele tipo de informação que considero o mais valioso: o autoconhecimento. De religiões a astrologia. De numerologia a eneagrama. De testes de personalidade de revista a estar todo sábado, às nove da manhã, sentada numa poltrona de couro numa sala da Savassi diante de uma psicóloga.
Adianta alguma coisa? Na minha opinião de curiosa do assunto adianta uns 90% e por isso sou propagadora de tudo o que mencionei acima. Já não compro qualquer briga porque me conheço o suficiente para saber que depois de toda e qualquer discussão me sentirei como um desenho animado esmagado por uma bigorna. Prefiro retirar meu time de campo porque já aprendi que, afinal de contas, sou péssima jogadora desde as aulas de educação física. Opto por batalhas silenciosas porque já sei que tenho o dom (ou o karma, sei lá) de fazer das minhas cordas vocais uma arma de fogo e a cada vez que fuzilo alguém me sinto como um desenho animado esmagado por uma bigorna. Um ciclo interminável que, hoje em dia, evito começar.Vale para coisas mais simples também. Me autoconhecer me permite dizer não a compromissos que não me interessam, me impede de fazer compras inúteis, segura meu impulso de cortar o cabelo num dia de fúria e me torna mais complacente com os outros. Me conheço, eu também faria aquilo.
Acontece que a vida não é só 90%. Em algum momento nos depararemos com uma situação que nos arranca de nossa zona de conforto sem dó, nem piedade, nem anestesia ou aviso prévio. Negaremos nossas crenças, contrariaremos nosso DNA, agiremos como arianos (mesmo sendo librianos) e, se em meio ao turbilhão, houver um lampejo de lucidez, nos questionaremos: “como fui capaz?”. “Como fui capaz de mergulhar nesse rio se nunca soube nadar,” pergunta-se a mãe que salvou o filho de um afogamento. “Como fui capaz de largar minha família para viver um grande amor do outro lado do mundo”, pergunta-se o cego de paixão. “Como fui capaz de dar a volta por cima quando não havia ninguém do meu lado”, pergunta-se a que decepcionou-se com os seus. A resposta? Porque era a única saída. Esse 10% de enredo que faz da vida uma confusão danada não é de múltipla escolha. São cenários desenhados quando estamos encurralados. Quando tomar uma atitude – ou melhor, quando tomar a atitude – é a única opção que irá nos permitir viver em paz. Ainda que a atitude em questão seja perigosa, arriscada, passível de julgamentos, intrigante e, por isso mesmo, surpreendente até para nós mesmos, que supomos nos conhecer tão bem.
É assustador. É como descobrir que existe uma outra pessoa totalmente desconhecida vivendo com você. Em você. Inevitável? Não sei. No tudo ou nada você pode passar a vida toda optando pelo nada. Só que nesse caso, sua vida nunca será 100%. É sua conta e risco.
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