CINEMA | SÉRIES CRÔNICAS

CINEMA MODERNO

No ano de 1996, o filme “Íntimo e Pessoal” caiu como uma bomba na minha emoção: ele quebrava a era do ‘felizes para sempre’. Eu me lembro de ter ficado sentada diante da tela enorme, imóvel, ouvindo a música triste até acabarem os créditos, e saí dali angustiada e silenciosa – e a amiga que me acompanhava não se mostrou menos melancólica.

De lá pra cá, isso se tornou constante: exceto as comédias românticas (que raramente valem o ingresso), os dramas literalmente se transformaram em reflexos definidos e perfeitos da realidade crua da vida cotidiana: é a arte imitando a vida com uma excelência que impressiona. Não mais amores que dão certo; não mais barreiras de religião ou raça vencidas; não mais curas milagrosas. Os novos scripts seguem o roteiro do sonho quase possível, mas não realizável: ou dão uma definição radical ou nem todas as pendências são solucionadas, deixando aquele sabor de que muito além do “The End”a coisa se estendeu sem resolver-se.

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Os filmes de ação também seguem a mesma linha: apesar dos bons enredos atuais, além de velozes demais -são de enlouquecer qualquer um com sua velocidade -, lhes falta um pouco de doçura, alguma coisa que os conecte a um sentimento sublime, muito acima de tiros e explosões projetados pelos efeitos especiais.

A era da internet nos propicia ver muitos filmes – muitos dos quais nem chegam aos circuitos de cinema por conta do pouco apelo comercial. É o caso dos filmes espanhóis, alemães, poloneses, finlandeses, indianos, franceses, russos, ingleses e também americanos que são verdadeiras pérolas da atualidade. Os europeus são espetaculares, densos, que nos incitam a pensar – o que nem todo mundo quer quando se trata de entretenimento.

Mas o que todos eles têm especialmente em comum é o final surpreendentemente chocante. É um susto, pelo menos pra mim, esse confronto com a desilusão, o abandono, a morte dos protagonistas, como se não houvessem mais personagens principais: igualaram-se todos ao nível das possibilidades de desfechos inesperadamente trágicos.

capa_cinemaTalvez o cinema esteja, cada vez mais, se descortinando para novos papéis dentro da sociedade – dentre os quais se destaca essa perda total da ingenuidade humana. Talvez os finais felizes não engordem mais as bilheterias e quem sabe até se a sétima arte perdeu sua função maior de entreter e divertir: agora, a ordem é nos lançar sempre à luz da verdade – aquela mesma que todos os dias trava uma batalha pessoal conosco.

Eu sempre adorei Cinema. Acho que é uma das expressões mais belas da retratação de cenas e imagens que habitam o campo das sensações. Mas ando ficando um pouco, digamos, aborrecida com esse repetitivo derrame de frustração das telas. Não demora muito e vou ter que me alimentar novamente dos Contos de Fadas – Cinderelas, Príncipes, Fadas e Bruxas, Peter Pan’s e Ganchos – para me abastecer a alma de esperanças.

Débora Böttcher
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Débora Böttcher

Débora Böttcher

Formada em Letras, com especialização em Literatura Infantil e Produção de Textos. Participou do livro de coletâneas "Acaba Não, Mundo", do site "Crônica do Dia", onde escreveu por 10 anos. Publicou artigos em vários jornais. Trabalha com arte visual/mídias. Administra esse portal - que é uma junção dos sites Babel Cultural, Dieta com Sabor, Hiperbreves, Papo de Letras e Falas Contadas.